quarta-feira, março 05, 2008

Salário mínimo (II)

Ainda abundam, entre alguma esquerda, os discursos “éticos”, reveladores de um desconhecimento sobre como funciona um mercado livre.

Nos EUA, o salário mínimo subiu recentemente de 5.15 para 7.25 dólares/hora.Em 1968, ele equivalia a 90% do nível de pobreza; em 2005, a apenas 50%. Na Europa, discute-se a desejabilidade de uma política comum sobre o salário minimo, nomeadamente, impondo que ele seja uma percentagem comum – 60%? – do rendimento médio de cada país. (Não confundir com a ideia assustadora de um valor nominalmente comum na UE, defendida por Miguel Portas).

Como ciência intrinsecamente “marginalista”, a economia neoclássica diz-nos que um empregador quererá pagar um salário igual ao valor da produtividade “marginal” do trabalho, num contexto de substituibilidade entre os factores de produção (trabalho, capital, etc). É uma teoria inspirada e aplicável à sociedade industrial do séc. XIX, mas desajustada e insuficiente para pensar a sociedade terciária do séc. XXI. Muito longe da cultura japonesa – onde o conceito de “accionista” é estranho e onde só se entende que uma empresa seja propriedade dos seus trabalhadores –, sabemos, no Ocidente, que pensar no “valor acrescentado” de um trabalhador pode ser redutor.

A ideia de que o salário mínimo acompanhe o nível de riqueza médio de um país é atraente e justa, mas não deve ser regulamentada de forma exacta.

Os trabalhos de limpeza ou de estafeta, mesmo que uma condição sine qua non para a operatividade de um negócio lucrativo, podem ser tão abundantes que permitam remunerá-los a um preço que impossibilite uma vida minimamente digna numa sociedade relativamente rica (pense-se no caso americano). Nesta óptica, somos levados a pensar no valor mínimo que uma hora de trabalho deve ter, por muito poucas qualificações que ele exija. Insistir, sem mais, na “escassez relativa”, significa que esquecemos o fundamental: aquilo que está por detrás da oferta de trabalho – a forma como se valoriza o contributo do trabalhador numa empresa.

A liberdade económica de quem emprega é essencial, mas nem sempre um dado entre nós. Ainda abundam, entre alguma esquerda, os discursos exclusivamente “éticos”, reveladores de um total desconhecimento sobre como funciona um mercado livre e que proporcionam efeitos contrários aos desejados. Legislar nem sempre é a melhor solução. A ideia de que o salário mínimo acompanhe o nível de riqueza médio de um país é atraente e justa, mas não deve ser regulamentada de forma exacta. A resposta a esta questão não pode ser burocrática, impositiva, matemática; tem de ser política, orientada por princípios claros, ponderados e aplicados casuisticamente.

Nota: invista no futuro, vá a www.umpequenogesto.org.